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ADRIANO MANGIAVACCHI

 

Anelar, nome dado por Adriano Mangiavacchi ao seu conjunto mais recente de trabalhos (entre pinturas sobre suportes convencionais, pedras, vidro, metais e imagens fotográficas) não deve ter seu significado reduzido apenas ao uso exclusivo e recorrente da forma circular. Se o tomarmos de um ponto de vista ainda formal, mas agora referido à organização espacial de toda a série, Anelar aponta-nos também para a modulação do plano a partir de anéis regulares. Uma maneira quase impessoal, controlada e objetiva, de produzir que se opõe ao modo de execução das pinturas anteriores de Adriano, uma vez que, ao contrário daquelas, a maneira atual deriva de um único um sistema.
 

Na década de oitenta, a produção de Mangiavacchi, era então marcada pela abstração informal. Resultava de uma feitura livre, sem projeto prévio, exigida pela poética do artista. A ocupação do plano pictórico era feita pelo próprio ato de pintar, um espaço produzido pelas trilhas dos gestos que compunham cores com rigor espontâneo e sutilezas imprevisíveis. Um lócus quase ideal da expressão subjetiva e da ordem processual que dela decorria.
 

Seus novos trabalhos, inversamente, são concebidos a partir de um projeto composicional permanente que transborda o âmbito exclusivo da pintura em direção a outros suportes não convencionais. No entanto a impessoalidade do partido espacial tomado, funciona qual uma âncora poética para a expressividade característica do processo de Adriano.
 

Se antes espaço e pintura surgiam simultaneamente de uma única ação subjetivada, essa ação, agora, parte de um espaço compositivo objetiva e previamente ordenado para o livre exercício da pincelada, para a experimentação de diversas possibilidades pictóricas – cromáticas, tonais, atonais, matéricas, gestuais, gráficas, em manchas, etc. – e do uso de materiais não convencionais como suporte. Despreocupado com o espaço, Mangiavacchi pode atravessar a pintura em direção às múltiplas possibilidades de experimentação contemporânea e à outras esferas significativas que também compõem a tessitura semântica dessas obras.
 

Adriano reconhece que relações simbólicas entre o círculo e o universo podem ser suscitadas pelos anelares. Mas são as memórias visuais cotidianas mais remotas do artista, da época de sua infância em Roma, que referenciam de fato os trabalhos da série Anelar.

Um depoimento escrito pelo artista em 2006 é esclarecedor:

 

“O círculo é um dos arquétipos que se encontram nas mais diversas civilizações. Segundo Jung, é uma imagem psíquica do inconsciente coletivo que é patrimônio comum a toda humanidade (..)
 

    Em Roma, infinitas referências arquitetônicas, desde o olho da cúpula do Pantheon até o monumento fúnebre do padeiro Eurisace que foi visão constante na minha infância e à qual meu trabalho atual faz diretamente referência.

  Infinitas auréolas mostrando quem era sagrado e quem não. Infinitas guirlandas, medalhões, madoninhas, templos e mausoléus. Tudo em forma de anel.”

Ao lado dessas referências simbólico-pessoais ele não esquece das influências formais e poéticas de artistas recentes, tanto modernos, quanto contemporâneos.


“Influências antigas, portanto, mas recentes também: como os círculos de terra de Richard Long, os círculos concêntricos de Kenneth Nolan, os alvos de Jasper Johns, até os discos simultâneos de Robert e Sonia Delaunay ”

 

Anelar é, portanto, um ponto de confluência de significados heterogêneos reunidos aqui por Adriano Mangiavacchi. Ao conectar sistema, processo, acaso e fatura artesanal, com materiais de origens variadas, com suas memórias pessoais e coletivas e o legado de outros artistas, ele tece uma rede poética que empresta sentido à sua investigação pictórica.

 

Texto de Fernando Cocchiarale para o catálogo

da exposição na Galeria Marcia Barrozo do Amaral

em setembro de 2010.

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